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Quais são os principais riscos em um relacionamento amoroso? Existem ferramentas para ajudar? Maria Alice Fontes, Fernanda Lee

A cada dia ouvimos a notícia de mais um casal que está se separando no nosso círculo de amizades. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), um a cada três casamentos termina em separação. O número de dissoluções disparou com o passar dos anos. Em 1984, ele representava cerca de 10% do universo de casamentos, com 93.300 divórcios. Essa proporção saltou para 31,4% em 2016, com 1,1 milhão de matrimônios e 344.000 separações.

Quais são os fatores que podem levar a separação?

Segundo John Gottman, 77 anos, pesquisador e psicólogo clínico existem alguns fatores que podem ser considerados fatais para uma união. Gottman e sua equipe trabalharam extensivamente durante quatro décadas, estudando o que poderia prever o divórcio e a estabilidade conjugal. Os estudos sobre casais recém-casados são os mais conhecidos.

Estas pesquisas concluíram que os quatro comportamentos negativos responsáveis por predizer o divórcio são: a crítica, a atitude defensiva, a indiferença e o desprezo. Ele chamou esses comportamentos de “Os Quatro Cavaleiros do Apocalipse”.

A crítica é um dos indicadores, um comportamento de ataque ao cônjuge, o qual faz menção geralmente a características de personalidade do outro, sempre de forma destrutiva.

A atitude defensiva é um outro comportamento que costuma aumentar o conflito, pois não permite que um dos lados assuma responsabilidade em questões delicadas do relacionamento. Quem está sempre na defensiva, não reflete sobre o que poderia fazer melhor na relação, pois está sempre gastando energia com desculpas, argumentações ou explicações.

Mostrar indiferença tem o propósito de evitar o conflito. Mas, quando nos distanciamos e nos desconectamos dos argumentos do outro, nos desconectamos principalmente da essência do outro, como se o problema não fosse conosco. São atitudes de silêncio, expressão corporal passiva, evasão, respostas cheias de lacunas que nos fecham em nós mesmos, nos colocando acima do problema e do relacionamento, como se o conflito simplesmente não estivesse acontecendo.

A atitude de desprezo coloca o outro para baixo como forma de se sentir superior. As pessoas que têm o mal hábito de focar e julgar as pessoas pelos seus erros tendem a apresentar mais atitudes de desprezo. Segundo as pesquisas, este é um dos piores venenos para um relacionamento, e a principal causa dos divórcios.

Nos estudos longitudinais, que envolveram casais violentos, as previsões se replicaram. Através do estudo da proporção de comportamentos positivos e negativos e da presença dos “Quatro Cavaleiros do Apocalipse” (Crítica, Atitude Defensiva, Indiferença e Desprezo), os pesquisadores poderiam prever se um casal se divorciaria com precisão de 90%.

Quanto tempo demora para um casal se separar quando existem muitos problemas no relacionamento?

Quando dados longitudinais de 14 anos foram disponibilizados, Levenson & Gottman descobriram um segundo padrão disfuncional: o desengajamento emocional. Essa atitude é marcada pela ausência de afeto positivo durante o conflito (falta de interesse, afeto, humor ou empatia). Com estes estudos eles fizeram algoritmos que poderiam prever não apenas se um casal se divorciaria, mas como também, em quanto tempo. Os casais que tinham a presença concomitante dos “Quatro Cavaleiros do Apocalipse” se divorciavam em média 5,6 anos após o casamento, enquanto os casais emocionalmente distantes (indiferentes) se divorciaram em média 16,2 anos após o casamento.

O que dizem as pesquisas sobre casais do mesmo sexo?

Levenson e Gottman também realizaram um estudo de 12 anos sobre casais homossexuais, trabalho que publicaram em dois artigos no Journal of Homosexuality. A pesquisa demonstra que todos os tipos de casais, hetero ou homossexuais têm os mesmos problemas e os mesmos caminhos para se manterem felizes juntos. Mas a pesquisa mostrou que há também algumas qualidades positivas, como humor e capacidade de se acalmar durante uma briga, que são especialmente importantes para casais do mesmo sexo.

Atritos acontecem, mas como aprender ferramentas para resolver os problemas?

Gottman foi reconhecido como um dos 10 terapeutas mais influentes dos últimos 25 anos e suas pesquisas mostraram que não era apenas como os casais brigavam que importava, mas como eles se reconciliavam após uma briga.

Gottman e Levenson apontaram que a boa comunicação e a escuta entre o casal poderiam garantir estabilidade ao longo do tempo (cerca de 80% de estabilidade nas discussões). Eles também descobriram que a maioria dos problemas de relacionamento (69%) nunca são resolvidos, sendo problemas “perpétuos” baseados em diferenças de personalidade entre os parceiros.

Os atritos podem ser minimizados se aprendermos novas habilidades para resolver problemas. A Disciplina Positiva pode ajudar, pois ensinamos ferramentas para cultivar um relacionamento feliz e duradouro. Saber escutar é uma das principais habilidades. As pessoas irão te escutar depois que elas se sentirem ouvidas. Será que você está escutando de fato, com o coração e empatia? Está conseguindo escutar o que o outro quer dizer, em vez que buscar ter sempre a razão?

Ter momentos especiais que cultivem os sentimentos que os uniram é também fundamental. Sabe-se que o excesso de telas é hoje um dos grandes desafios dos casais. Os eletrônicos são viciantes e interferem de forma intensa nos relacionamentos pessoais. Será que vocês têm se escondido atrás das telas para não aumentar os conflitos atuais? Tentem conversar sobre os seus hábitos em relação ao tempo de tela. Como cada um se sente sobre isso? Seria possível buscar controlar e desenvolver áreas onde as telas não são permitidas, como por exemplo na mesa de refeições e ao lado da cama? Escolham soluções e atividades que ambos concordem para minimizar o tempo de tela.

Procure evitar as discussões e foque seus esforços em buscar soluções para cada problema. Assim, o casal pode compartilhar suas expectativas e fazer pequenas coisas com entusiasmo para quebrar a monotonia. Algumas dicas como perguntar em vez de mandar, estar sempre atendo a escutar e validar os sentimentos do outro, além de dar uma pausa para acalmar a cabeça antes de discutir podem ser ferramentas importantes para cultivar o bom relacionamento.

Qual é a importância do diálogo e da empatia durante os conflitos?

Conversar é sempre a melhor maneira de chegar a um acordo. Uma relação humanizada começa com a abertura para uma conversa franca, aprendendo a se colocar no lugar do próximo. Muitos casais têm altas expectativas e não conversam muito, querem apenas ter razão. Quando não se chega a um acordo é sempre bom reconhecer e se responsabilizar pelos seus atos, buscar a reconciliação de forma aberta e resolver o que ficou pendente.

Quando vale a pena procurar especialista para ajudar a enfrentar esse processo? Por quê?

A intervenção de um especialista é sempre positiva quando o casal cessou todas as possibilidades de conversa e entrou na indiferença e no desprezo. Em muitos casos o casal precisa de um intermediador para conseguir conversar e achar soluções conjuntos. O psicólogo de casal deve focar seus esforços para melhorar a relação, evitando tratar questões individuais na sessão de casal. O psicólogo age como um intérprete de um para o outro, facilitando a comunicação e ensinando novas habilidades para que o casal possa praticar em casa.

Se o seu cônjuge tem 80% de características positivas e 20% de defeitos, mas você passa 80% do seu tempo focado nos defeitos, provavelmente só vamos enxergar os pontos negativos. O foco está em valorizar os pontos positivos do parceiro e lidar com as possíveis dificuldades com um diálogo respeitoso. Conversar sobre o que vocês dois esperam do relacionamento é fundamental para se construir uma lista de propósitos do casal, que vai ajudar a guia-los ao longo da vida.

Bibliografia

John Gottman, Nan Silver, O que faz o amor durar? Editora Fontanar. 2014.
Jane Nelsen, Mary Nelsen Tamborski. Baralho da Disciplina Positiva para Casais. Editora Manole.
Carrère S, Buehlman KT, Gottman JM, Coan JA, Ruckstuhl L. Predicting marital stability and divorce in newlywed couples. J Fam Psychol. 2000 Mar;14(1):42-58.
Gottman JM, Levenson RW. How stable is marital interaction over time? Fam Process. 1999 Summer;38(2):159-65.
Gottman JM, Levenson RW, Swanson C, Swanson K, Tyson R, Yoshimoto D. Observing gay, lesbian and heterosexual couples' relationships: mathematical modeling of conflict interaction. J Homosex. 2003;45(1):65-91.

2019-05-06 00:00:00

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