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Egoísmo, violência e estresse nas grandes cidades. Mariana Bacigalupo Martins, Maria Alice Fontes

Temos recebido várias queixas psicológicas sobre como se tornou insuportável viver nos grandes centros urbanos. A falta de atenção, associada ao anseio em chegar primeiro, cumprir as metas, ganhar e consumir acabam produzindo um cenário de estresse, ansiedade e depressão. A violência e o caos que experimentamos diariamente não é apenas resultado do crescimento desenfreado, mas o retrato de uma sociedade que está guiada por ideais pessoais e egoístas.

A violência tem explicação?

Segundo Costa [1] a violência no Brasil tornou-se “uma forma corriqueira de levar ao extremo o jargão leviano que tudo é mercadoria”. Para este autor estamos imersos em uma cultura “narcísica” que se nutre da decadência e do descrédito social, que rapidamente se degenera em cultura da delinquência. Ele diz que “O desaparecimento da figura do Ideal coletivo dá lugar ao surgimento da figura do fora-da-lei, como imagem Ego-Ideal”. “O delinquente é a forma que o homem supérfluo encontra para sobreviver socialmente na cultura da violência” [2]. Esse “homem supérfluo” é produto de uma sociedade profundamente individualista e competitiva onde a onipotência não aceita limites e onde há um profundo desprezo pela vida das outras pessoas.

Ato de violência: uma forma de potencia e satisfação.

Baudrillard (1990) [3] estuda uma série de fenômenos violentos no mundo moderno e a maneira como se manifestam. O autor aponta que a violência para os jovens assume uma forma “lúdica e espetacular”. Em muitos casos, brincadeiras violentas potencializam a excitação, os níveis de adrenalina, tendo o efeito de uma droga. Além do prazer, abrem o caminho para que possam participar do espetáculo montado pela mídia e se fazerem notados pela sociedade. Neste contexto, é graças à violência que algumas pessoas se sentem potentes. A violência, segundo este autor, seria fruto da modernidade na qual todos almejam a fama, mesmo que ela dure apenas alguns segundos.

A gentileza como contraponto

Como contraponto às diversas teorias sobre a origem e função da violência, Samuel Bowles, discute a “sobrevivência do mais gentil”, e aponta que foi graças à gentileza que a espécie humana prosperou. Bowles, do Instituto Santa Fé, nos Estados Unidos, analisou sociedades antigas e verificou que a gentileza era componente fundamental da sobrevivência das comunidades. “Grupos com muitos altruístas tendem a sobreviver”, diz ele. “Os altruístas cooperam e contribuem para o bem-estar dos outros integrantes da comunidade.” Gutierrez, JLR[4], prefere pensar na gentileza não como um comportamento, mas como uma virtude. "Não só a gentileza parece menos cultivada, mas em geral hoje não se fala muito das virtudes. Parecem esquecidas", diz. Gutierrez ressalta que a gentileza só tem valor positivo quando associada a conceitos como generosidade ou misericórdia. Por si só, a gentileza é neutra". Portanto, a gentileza só poderia ser considerada um “remédio contra a violencia” mediante valores éticos e de empatia por outro ser humano.

Um remédio frente à violência

A gentileza nos faz bem de várias maneiras. O professor Post S [5], autor de Why Good Things Happen to Good People (Por que coisas boas acontecem a pessoas boas), examinou a relação entre ser gentil e saúde. Um estudo com 2.016 pessoas verificou que os que ajudavam os outros regularmente tinham mais saúde mental e menos depressão. O estudo constatou que as pessoas solidárias têm menos probabilidade de sofrer de doenças crônicas e que seu sistema imunológico tende a ser mais eficiente. “Existe uma relação direta entre bem-estar, felicidade e saúde nas pessoas gentis”, diz Post. A gentileza talvez ajude a regular as emoções, o que causa impacto positivo sobre a saúde. Se nosso instinto biológico automático do tipo “lutar ou correr”, ficar ativo demais por causa do estresse, o sistema cardiovascular é afetado e a imunidade do corpo enfraquece. “É difícil ficar zangado, ressentido ou amedrontado quando se demonstra amor altruísta pelos outros”, afirma Post.

Portanto, a gentileza não é a única saída frente à violência e o egoísmo, mas pode minimizar seus efeitos negativos. Diante de uma sociedade que perdeu a dimensão dos ideais coletivos e com todas as consequências do individualismo e de consumo acima de qualquer valor, ter gestos de gentileza e ajudar as pessoas pode no mínimo, fazer lembrar que vivemos juntos e que a ligação entre as pessoas é uma possibilidade para viver se viver bem.

Fontes:

[1]COSTA, J.F. “Narcisismo em tempos sombrios”. In: FERNANDES, H.R.(org.). Tempo do desejo: sociologia e psicanálise. São Paulo, Brasiliense, 1989, p.109-136.
[2] idem,p.133
[3]
http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/revistafamecos/article/view/3091/2367
[4]http://www.istoe.com.br/reportagens/18737_POR+QUE+SER+GENTIL+VALE+A+PENA
[5]http://www.selecoes.com.br/mundo-melhor/gentileza-o-segredo-da-felicidade_3152.htm
MILLER, J.A. e LAURENT, E. O Outro que não existe e seus comitês de ética, In: Curinga no. 12, set 98 - A clínica psicanalítica no mundo globalizado, p. 4-18.

2012-10-19 00:00:00

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